quinta-feira, 31 de julho de 2008

Machado de Assis na Escuridão da Ignorância

Abro a caixa, anunciando que os alunos teriam um presente literário e começo a distribuir uma edição do livro Dom Casmurro. Me esforço em comentar que tão importante quanto nos alimentarmos de forma equilibrada e sadia é lermos obras do porte de Machado de Assis.
Mal concluía minhas considerações e, um aluno bem afeiçoado, jovem de 25 anos, trabalhador e pai de família, olha para mim e para o livro em suas mãos e pergunta:
- Professor, em quê esse livro vai mudar a minha vida? Em quê ele vai me ajudar? Ele vai me ensinar a ganhar dinheiro? Pra que serve a obra desse tal de foice ou machado, sei Lá?!
De imediato, minha vontade foi chamá-lo de ignorante – e não seria errado classificá-lo. Mas, hesitei e pus-me a orientar de forma que todos os presentes pudessem ser contemplados pela minha resposta ao riso geral:
- Dom Casmurro é um romance do escritor brasileiro Machado de Assis. Foi publicado em 1899, e é um dos livros, da literatura brasileira, mais traduzidos para outros idiomas. É uma obra do Realismo brasileiro. Em Dom Casmurro, encontramos a dúvida sobre a existência do adultério de Capitu, não havendo nenhuma cena que o comprove, permanecendo apenas como suspeitas. Sendo escrito em primeira pessoa, apresenta apenas a interpretação dos fatos presenciados pelo narrador-personagem, não apresentando em nenhum momento outras visões. O fato de o autor escrever o romance em capítulos curtos, com títulos explicados posteriormente e de utilizar citações de obras importantes e personagens históricos, em frases curtas, facilita a leitura e prende o leitor. Machado de Assis permite, ao deixar o final com uma questão em aberto, que um mesmo leitor retome o livro e tire diferentes conclusões a cada vez que o re-lê.
Nesse momento, diante da minha singela explicação de quem não é um especialista em Literatura Brasileira, mas amante da boa leitura, havia um silêncio claustro na minha sala de aula. Era quase possível ouvir os pensamentos dos alunos e os meus também. A minha aula que deveria começar com uma revisão da última aula, partiu pra biografia deste gênio que foi e continuará sendo Machado de Assis, vergonhosamente chamado de “foice” pelo meu aluno do Projeto Acelera.
E continuei:
- Machado de Assis foi um dos poucos escritores brasileiros que conseguiu transpor os extremos da vida social, econômica e cultural de sua época. Um menino, filho de uma lavadeira e de um pintor de paredes, que se torna um trabalhador, que é um trabalhador manual e um tipógrafo, que se torna jornalista, poeta, dramaturgo, escritor, romancista e presidente da Academia Brasileira de Letras e é consagrado em vida, é alguém que atravessou a sociedade brasileira em todos os seus ângulos.
Ao concluir pequeno resumo de quem foi Machado, me voltei para o meu aluno, interlocutor inicial de minha aula e finalizei, olhando em seus olhos:
- Se você encontrar um livro que lhe ensine a ganhar dinheiro me diga. Eu serei um dos compradores e leitores mais fiéis que poderá existir. Agora, se você conhecer Machado de Assis e sua obra, se ao final da leitura do livro que você abou de ler, não conseguir perceber a intrínseca relação entre o que você é e o conteúdo histórico dos mesmos (autor e obra), por favor, desista de estudar. Caso algo lhe toque, caso alguma folha de Dom Casmurro excite sua mente a buscar ultrapassar as páginas seguintes, lhe fazendo descobrir como é bom ler e como é bom sermos espelhos refletidos positivamente em nossos filhos (pra quem desejamos os melhores livros), por caridade, leia mais e liberte-se da escuridão da ignorância.

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