Anos atrás, caminhava pela avenida Conde da Boa Vista, centro da nossa Veneza, quando um jovem adolescente, vestido a caráter – preto, pulseiras no braço, barbicha por fazer, calça super folgada – mirava os olhos em meus olhos enquanto se aproximava. Sem que eu tivesse tempo de perguntar por que ele me olhava fixamente, ele apontou o dedo indicador acima do meu peito e perguntou:
- Onde você comprou esta camisa?
- Na C&A, meu rapaz. - respondi de pronto (sem querer fazer merchandising).
Ele balançou a cabeça negativamente e sentenciou:
- Isso é um absurdo! Essa estampa virou pop. Todo mundo quer usar, mas não sabe o que significa. – Disse isso e partiu sem permitir que eu argumentasse, sem que buscasse um diálogo amistoso.
Parei por alguns segundos e o turbilhão de pessoas indo e vindo, todo o barulho daquela avenida simplesmente sumiram dos meus sentidos, enquanto eu observava o rapaz se afastar e me fazia afundar minhas ideias, raciocinando o que, de fato, aquele “rebelde sem causa” quis me dizer.
Se não me falhe a memória, este episódio ocorreu no final dos anos 90, ou seja, há mais de dez anos. A estampa que ele se referia é o símbolo do comunismo, em cor prata sobre a camisa preta que eu tenho até hoje. É uma bela camisa.
Creio que passei alguns instantes para entender o motivo da indignação do jovem. Mas não foi tão difícil se apoderar do sentido real. Ele queria me dizer de sua revolta em ver um símbolo tão poderoso, referenciado e, porque não dizer, iluminado, nas ruas, nas camisas, nas lojas de grife. Para ele, o símbolo do comunismo, assim como a própria ideia são elementos que não podem ser vulgarizados pela propaganda, não poderiam cair na boca do povo, que frequentemente não entende o que carrega nas camisas, na forma de pensar, na maneira de encarar um programa de TV, na forma como ideologias surgem sem que o senso comum não abrace como verdade absoluta.
Eu até compreendi sua colocação. Mas não aceitei e lamento muito não ter tido tempo de conversar e buscar fazer o adolescente entender que a luz das velas, das lamparinas, dos lampiões não podem ficar debaixo da mesa. Quanto mais gente for atingida pela luz, mais iluminado ficará nosso mundo, e, consequentemente, a vida no planeta seria outra.
Enquanto ele se lamentava por ver “na moda” ideias como as do Comunismo, difundindo-se massivamente, eu lamento que muita gente, ainda nos dias de hoje, nos apontam (comunistas) como sendo devoradores de fígados, de criancinhas inocentes. E revolta maior ainda é saber que Belchior tinha razão, quando ele disse, em uma de suas belas canções: “Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”.
Assisti horrorizado a vergonha de ver um representante do partido comunista do Brasil, virar servo de interesses latifundiários, e simplesmente achar que o Congresso e a política brasileira ainda possuem pessoas preocupadas com a verdade, com a justiça e com o nosso solo. Aldo Rebelo achou que não se notaria a diferença entre as palavras “Recomposição e Regularização” no texto final que aprovaria o novo Código Florestal.
É, Belchior. Você continua tendo razão. As aparências, de fato, não enganam, não.
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