*Por Gilson Edmar
O recifense convive com a monotonia de um clima quente, de modo contínuo de janeiro a dezembro. O que se diferencia, do ponto de vista climático, é o período chuvoso, que geralmente vai de maio a julho e que chamamos de inverno. Com a chegada da chuva, aumenta a umidade relativa do ar, porém não cai a temperatura, apenas dando a sensação de melhoria térmica, quando causada por grandes precipitações. Além de termos um inverno quente, diferente de outros locais, o recifense sofre no período chuvoso com o alagamento de ruas, transbordamentos de canais, invasão de água nas casas e grandes engarrafamentos.
Esse clima quente e úmido motivou os recifenses a procurar alternativas na também diversidade climática, além da cultural, do nosso Estado. Criou-se o hábito de subir a Serra das Russas para usufruir de um clima mais ameno que o da capital. Assim, por estar situada próxima a Recife, a cidade de Gravatá passou a ter um papel relevante, como indutora do turismo interno de Pernambuco. No início era de modo mais tímido, mas com o passar dos anos tornou-se um polo importante deste turismo interno, com uma infraestrutura que permite um lazer diferenciado para os recifenses.
Outrora, a viagem não era tão simples, pois tínhamos que enfrentar as lombadas de Vitória de Santo Antão e a subida da Serra das Russas, em uma estrada simples, na maioria das vezes atrás de caminhões. Um dos primeiros passos neste desenvolvimento turístico foi quando um grupo de pessoas, incluindo vários médicos, comprou casas na Vila da Cohab, transformando-a quase num condomínio, com área de lazer, o Clube Cohatá. Geralmente, os amigos compravam casas juntos ou próximos, numa convivência saudável e saudosa. Eram animados os períodos juninos, a cada ano sendo aperfeiçoados pelos moradores, com fogueiras, comidas e, é claro, os fogos e as bombas.
Outra característica interessante é o modo cíclico de passar o inverno em Gravatá, sendo mais frequente quando os filhos são pequenos, diminuindo quando atingem a adolescência, vindo só nas grandes festas, ficando no Recife junto com os amigos na maior parte do tempo. Volta novamente a ser frequente quando os filhos casam ou quando surgem os netos. Mas por que Gravatá nesta época de inverno? O seu sucesso se deve a seu clima ameno, até mesmo frio, para os nossos padrões. Aliás, é comum as pessoas dizerem com orgulho que, nas suas casas, a temperatura já chegou a 10 ou 13 graus, fato nunca visto por outras pessoas.
Mas o frio leva os recifenses a mudar os seus hábitos, podendo usar roupas de inverno, por vezes exageradas, mas importante pela oportunidade de usá-las e para dar este belo astral à cidade. Além do vestuário, sobe-se a serra para comer uma fondue, tomar um chocolate quente e outras iguarias, próprias do inverno, para os adultos e os passeios de cavalo, para as crianças. Em um das nossas estadas, as crianças se rebelaram e exigiram que nós as levássemos para comer fondue. Para brincar com elas, dissemos que íamos oferecer um hambúrguer, acompanhado de uma Pepsi quente, para tirar o apetite da tropa.
As crianças se reuniram e a partir do almoço nada mais comeram. À noite, ao chegarmos no restaurante, foi uma festa: a alegria da mesa da criançada e nós nos divertindo com a trama que jamais seria realizada, mas que eles acreditaram.
Artigo publicado na edição de 26 de maio do Jornal do Commercio
*vice-reitor da UFPE
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