domingo, 14 de agosto de 2011

Saga Brasileira


Por
Gustavo Krause*


“A longa luta de um povo por sua moeda” complementa o título do livro de Miriam Leitão, imprescindível para a compreensão do Brasil contemporâneo.

Com efeito, o livro ultrapassa a proposta superficial da crônica; o livro é um estudo penetrante do passado recente e um relato criterioso dos eventos de modo a transmitir uma idéia que se traduz na luta de um povo na construção de sua moeda. É obra historiográfica construída por uma testemunha privilegiada que enxergou os fatos, exercendo o jornalismo sério, crítico e interpretativo.

Entre outras, o trabalho combina a virtude da inspiração com estafante transpiração: varreu fontes primárias, recompôs fatos, eventos notórios e de bastidores, extraídos de protagonistas vivos e bem pensantes. Todavia, a alma de repórter da autora não abriu mão de demonstrar a centralidade do papel do povo nesta admirável saga assim como fez o leitor sentir a leveza do estilo de quem sabe escrever para consumo do cidadão comum.

No entanto, a maior virtude da obra está nas lições que ficam da leitura atenta.
Antes de tudo – ensina a longa narrativa – é preciso ter idéias e formuladores consistentes, seguindo-se políticas públicas factíveis e eficazes que de nada valerão se não contar com um sólido suporte político. No caso brasileiro, o diagnóstico da doença crônica da inflação desafiou vários governos. Tratava-se de um vício. Uma terrível dependência química movida pela mais poderosa das forças: a inércia.

Neste sentido, a história fará justiça aos economistas e aos gestores que, com competência profissional e espírito público, aprofundaram as bases da racionalidade econômica num país supersticioso, sebastianista, movido por crendices e pajelanças na seara da economia.

A tosca gestão fiscal brasileira começou a mudar com a faxina tecnocrática que pôs fim a conta-movimento, propôs a separação entre o Banco do Brasil e o Banco Central e a unificação dos orçamentos. Acertadamente, Miriam Leitão identificou naquelas medidas “a pedra fundamental do edifício que levaria a alguma ordem fiscal”.

De outra parte, a perspicácia da autora enxergou nos fracassos retumbantes e nas graves crises por que passou o Brasil saldos residuais que se tornariam instrumentos importantes na luta pela construção da moeda: do fracassado Plano Cruzado, diz ela, “Um novo consumidor, atuante, consciente, disposto a vencer a inflação, nasceu naquele plano fugaz e intenso”; da marca insensata do governo Collor, superlativamente devastadora pelo confisco da poupança, Miriam identifica abertura comercial, a negociação da dívida externa e a privatização como “passos essenciais para a estabilização”.

Na sequência, uma sucessão dramática e traumática que testou a resistência da novel democracia brasileira, passou o pesado leme da Presidência da República a Itamar Franco. Apesar do otimismo moderado da ressabiada população brasileira, as turbulências continuaram e a persistente inflação derrubou, rapidamente, três ministros da Fazenda, até que entrou em cena Fernando Henrique Cardoso.

Com rigorosa fidelidade aos fatos, a autora confirma as lições do êxito do Plano Real: suporte político às boas idéias, desdobradas em medidas assimiladas pela sociedade e uma capacidade especial do então ministro e futuro presidente em responder, explicar e superar as mais complexas dificuldades que o livro conta com detalhes impressionantes. Um adendo: em janeiro e fevereiro de 99, início do segundo mandato presidencial de FHC, a crise cambial associada às várias crises internacionais prenunciou a tragédia de mais um plano fracassado que, felizmente, não se concretizou graças à aplicação dos remédios amargos e necessários.

Eis o momento culminante e decisivo da saga: a moeda estável deixa de ser um projeto de governo e se transforma em conquista da sociedade. A democracia passa a ser fiadora da nova era. Comprovação: o PT elegeu Lula Presidente da República; o Presidente da República e o seu partido que eram “contra tudo que está aí” usaram sabedoria política ao negar tudo que pregaram quando escreveram a “Carta aos brasileiros”; Lula compreendeu que popularidade rima com estabilidade; blindou as políticas macroeconômicas e não admitiu economistas/militantes no comando da gestão econômica; fundiu sabedoria com esperteza eleitoral ao cunhar a expressão falsa, porém comprada pela grande maioria da opinião pública “Nunca antes na história deste país….”

Definitivamente, o Brasil não é para principiantes. O livro certifica a afirmação e a autora vai mais além: a dedicatória do livro aos filhos demonstra, de um lado, natural e compreensível significação afetiva e, de outro, assume o singular simbolismo histórico de revelar o passado de modo que as atuais e futuras gerações não venham a sofrê-lo como destino.

*Gustavo Krause Gonçalves Sobrinho (Vitória de Santo Antão, 19 de junho de 1946) é um político brasileiro, filiado ao DEM. É advogado, especializado em Direito Tributário, e consultor de empresas. Foi governador de Pernambuco e prefeito do Recife.

Em 1979 foi nomeado pelo então governador Marco Maciel prefeito do Recife, cargo que ocupou até 1982. Na prefeitura realizou muitas obras estruturadoras, principalmente nas áreas de periferias, como escadarias e muros de arrimos. Mas a maior marca da sua gestão como prefeito foi fixação dos chamados "barracões" da prefeitura nas áreas pobres do município, que eram "centros de atendimentos social" com médicos, engenheiros e vários servidores que atendiam a comunidade.

Eleito pelo voto direto vice-governador de Pernambuco na chapa encabeçada pelo ex-vice-governador Roberto Magalhães (PDS), assumiu o posto de governador de 1986 a 1987, em decorrência do afastamento de Magalhães para disputar a eleição de senador. Em 1988 foi eleito vereador de Recife.

Em 1990 foi eleito deputado federal pelo estado de Pernambuco. Assumiu o Ministério da Fazenda do Brasil durante o governo Itamar Franco. Tomou posse em 2 de outubro e deixou o ministério em 16 de dezembro de 1992 - apenas dois meses de cargo.

Em 1994 disputou e perdeu para Miguel Arraes a eleição de governador de Pernambuco.

Foi ministro da fazenda no Governo de Itamar Franco, permanecendo menos de dois meses na função.

No primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995 - 1999) assumiu o Ministério do Desenvolvimento Urbano e do Meio Ambiente.

Atualmente é conselheiro político do DEM e suplente do senador de Pernambuco Marco Maciel.

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