"A solidão é fera, solidão devora. É amiga das horas, prima e irmã do tempo. Que faz nossos relógios caminharem lentos, causando um descompasso no meu coração."
Alceu Valença.
A Revista Veja, ano passado, publicou uma excelente reportagem que nos informava que no Brasil 9% dos lares já são compostos de pessoas que moram sozinhas. Elas formam um mercado respeitável e se dizem felizes. Mas ninguém gosta de se imaginar solitário para sempre.
A tendência a viver sozinho é mundial. Alguns dos países campeões de domicílios ocupados por uma só pessoa são: Suécia, com 4)%; Dinamarca, 36%; Inglaterra, 35%; Alemanha, 30%; França, 30%; Estados Unidos, 26%. No Brasil já são 9%.
DESAGREGAÇÃO DA FAMÍLIA
Muito se tem falado nos últimos tempos sobre a desagregação da família tradicional, composta de pai, mãe e filhos morando na mesma casa. Com o alto número de separações e recasamentos, cada vez menos lares são formados exatamente por esses personagens. Além disso, já virou motivo de conversa que, como o casamento deixou de ser uma prioridade, as uniões agora ocorrem mais tarde. Pouco se comenta, no entanto, a respeito de um subproduto dessa nova realidade: o número de domicílios habitados por apenas um homem ou uma mulher. Hoje em dia, para um contingente cada vez maior de pessoas, morar só é um estilo de vida – não importa se bom ou não, feliz ou infeliz.
JÁ SÃO 4 MILHÕES NO BRASIL
Segundo o levantamento mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 4 milhões de brasileiros moram sozinhos. Essa fatia ocupa 9% dos domicílios do país. Em algumas capitais, como Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, uma em cada 8 casas tem apenas um morador e metade dos apartamentos e "flats" é ocupada por uma única pessoa. A quantidade dos que vivem sozinhos, no Brasil, é pequena se comparada à da Inglaterra, onde um terço das casas tem apenas um morador, ou à cidade de Paris, em que 50% são habitados por uma pessoa somente. Mas viver só é uma tendência mundial na qual o Brasil se enquadra perfeitamente. "Nos últimos 18 anos houve um crescimento de 41% no número de pessoas que moram sozinhas no país", contabiliza o sociólogo Rafael Osório, consultor do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA).
VANTAGENS DE MORAR SOZINHO
Na maioria das vezes, diz a Veja, as pessoas que vivem sozinhas são independentes e instaladas em lares confortáveis. Gostam de proclamar que é ótimo não ter de dar satisfação de nada a ninguém e costumam fazer uma lista as vantagens de ser sozinho – assistem ao que desejam na televisão, decoram (ou bagunçam) a casa de um jeito todo pessoal, entram e saem sem dar explicações, lêem até altas horas na cama, etc. Mas, à medida que o diálogo avança, não é difícil extrair dos solitários a confissão de que a perspectiva de viver só para sempre é preocupante. Para alguns, chega a ser apavorante. No balanço geral, querem mesmo é ver mais uma escova instalada no copo em cima da pia do banheiro, ainda que não imediatamente.
Um grupo de discussão de pessoas entre 30 e 40 anos, em São Paulo, solteiros, viúvos e separados demonstrou as vantagens e desvantagens de viver só. Em sua maioria, convivem sem grandes problemas com a falta de companhia, mas manifestaram o medo de permanecer solitários para o resto da vida.
"E SE EU CAIR?"
É claro que é possível viver bem sozinho, mas, em certos momentos, é difícil driblar a tristeza de não ter ninguém ao lado. Para não falar dos pensamentos terríveis que atormentam as pessoas sós de qualquer idade – do tipo "E se eu cair, bater a cabeça e desmaiar, quem vai me socorrer?". Tudo fica mais complicado, porém, para os que deixam de ver no horizonte a possibilidade de ter um companheiro. Nessa hora, bate a culpa e a auto- estima baixa a níveis abissais. "A solidão pode levar a que a pessoa forme uma imagem negativa de si própria e julgue que ninguém a aprecia". A dor de estar só é um dos preços a pagar pelo individualismo. Os mais pessimistas chegam a dizer que, mais do que nunca, as pessoas estão propensos a enxergar na família apenas um instrumento de realização pessoal.
O SENTIMENTO MAIS TEMIDO
"A solidão é um dos sentimentos mais temidos pelo ser humano. Todo mundo sabe que muita gente que se casa aos 50, 60 anos não o faz porque está apaixonada, mas para garantir uma companhia no futuro". Mas à medida que mais e mais pessoas entram na idade madura sozinhas, mais assimilável vai se tornando o conceito. Ser solteiro aos 35 anos não é mais sinônimo de homem volúvel demais ou homossexual. Ser solteira aos 40 não mais represente, obrigatoriamente, mulher encalhada, a coitadinha que ficou para titia.
"Viver sozinha foi a decisão mais acertada que já tomei", afirma uma publicitária de 34 anos. Depois de um casamento de 6 anos, ela preferiu alugar um quarto-e-sala a voltar a morar com a mãe em um apartamento de frente para o mar. Apesar de estar gostando da experiência ela sonha em casar novamente. "Adoro ser independente, mas sinto falta de um companheiro, tanto para trocar lâmpadas como para conversar. É penoso não ter ninguém ao lado quando o telefone toca de madrugada. Receber uma notícia ruim sozinha é desesperador."
A FALTA DE UM PARCEIRO CONTRIBUI PARA DEBILITAR A SAÚDE
É o que dizem os médicos. Explica-se: os solitários tendem a levar uma vida mais desregrada, o que, do ponto de vista orgânico, é uma bomba relógio. Por outro lado, a solidão força a pessoa a conviver consigo mesma dentro de um quadro de introspecção que pode tornar-se insuportavelmente sufocante.
As estatísticas confirmam que solteiros e divorciados têm mais possibilidade de suicídio e de ficarem deprimidos. Além disso, diminuem sua expectativa de vida. Entre os casados com 48 anos de idade, cerca de 90% deverão viver até os 65 anos. Já entre os solteiros, a expectativa é de 60%. "É curioso notar que quem mora só e acredita estar bem assim, afirma que trocou a tensão, a raiva e o stress do convívio doméstico pela tranqüilidade de viver sem ninguém", afirma psicanalista Luiz Alberto Py. "Viver só, no entanto, dá muito trabalho. É chato não ter ninguém para cuidar da casa ou de nós quando ficamos doentes. Além disso, nem sempre é satisfatório ter de pegar a agenda do telefone e sair pelos bares para dar um jeito na via sexual", acrescenta.
UM HOMEM PARA CHAMAR DE SEU
Mais numerosas no bloco do eu sozinho, as mulheres são vítimas da chamada "compressão do mercado matrimonial", nome pomposo para a conhecida falta de homens dispostos a casar. "Nos grupos de discussão acompanhados por VEJA, percebe-se claramente como boa parte das mulheres não consegue enxergar a possibilidade de casar-se", diz a psicóloga Suzy Cortoni. "Elas nem falam em filhos, porque acreditam que só por um golpe de sorte vão constituir família. Já o homem tem certeza de que vai encontrar uma parceira – pessoa fixa para fazer sexo, ficar junto no fim de semana e cuidar dele se ficar doente." Outra conclusão do grupo é que a falta de oportunidade está longe de significar falta de vontade: as mulheres querem, sim, um homem para chamar de seu.
LIBERDADE
Por outro lado, "em vez de economizarem para a educação dos filhos, os sozinhos investem neles mesmos, gastando o que querem com "personal trainers", salões de beleza, spas e tudo que lhes propicie conforto e prazer no dia a dia", comenta Ana Paula Cortat, diretora de pesquisa da agência de publicidade Leo Burnett. "Preenchem o cotidiano com diversas atividades para não se sentirem sós: fazem cursos, experimentam terapias alternativas, etc. Os serviços de entretenimento são os grandes beneficiários desse novo grupo de pessoas. Nos Estados Unidos, em 30 anos aumentou em 50% o número dos sozinhos, que movimentam 80 bilhões de dólares. No Brasil, 30% das viagens a passeio são feitas por eles. Metade dos aparelhos de DVD e um terço dos telefones celulares do país (sendo o telefone, como se sabe, o melhor amigo de quem mora sozinho), estão nas mãos de solteiros, divorciados e viúvos.
BOA E RELAXANTE
Falou-se que a solidão pode ser boa e relaxante. Ela é importante para a concentração, a memória, a reflexão e para expandir a criatividade. Para quem já se aposentou, está velho e não tem um trabalho como motivação, a solidão, quando ataca, pode ser ainda mais acachapante". Por outro lado, viver sozinha, seja por não ter se casado, seja por ter se casado e separado, não é mais problema. Ser solteiro aos 35 anos não é mais sinônimo de homem volúvel demais ou homossexual. Ser solteira aos 40 não mais representa, obrigatoriamente, mulher encalhada, a coitadinha que ficou para titia. Mas, apesar de muitas gostarem de viver sozinhas, muitos sonham em casar novamente. É penoso não ter ninguém ao lado quando o telefone toca de madrugada. Receber uma notícia ruim sozinha é desesperador.
"Nunca tive família. Minha família sempre foram meus amigos. O que me entristece é que muitos deles já se foram e é disso que tenho medo: viver demais e acabar sem ninguém com quem eu possa dividir meu passado", diz Margarita Schullman, que, aos 78 anos, mora nos asilo Lar Golda Meir, em São Paulo. Não há, na vida de quem é sozinho, uma medida que permita diferenciar, como no colesterol, a quantidade de solidão "boa" e "ruim". Uma pessoa pode passar a maior parte do tempo sozinha e se sentir bem, ser boa companhia para si mesma. Outra pode estar cercada de gente e se sentir única no mundo – o que é fruto das circunstâncias (um casamento infeliz, por exemplo).
Para evitar a solidão, há os que têm bichos de estimação e os que se apegam a afilhados e parentes. Ter família, ou alguma companhia, é uma apólice de seguro para a velhice, e quem não tem sente que precisa arranjar alguém para exercer esse papel. "Estreitar os vínculos com os amigos vai ganhando importância com a idade", comenta a psicóloga Ceres Araújo. Outro solitário, com 80 anos, confirma que momentos de solidão profunda podem ser atenuados quando se tem muita gente em volta. O truque que ele usa é reviver a vida. Mas, às vezes, quando vê ma TV cena de família fazendo festa, fica muito triste. E chora, chora muito. Depois, lava o rosto e vai dançar. Ele encara da melhor forma possível um dos piores pesadelos de quem mora sozinho: o de terminar seus dias num asilo de velhos.
SOLUÇÕES NO RECIFE
Até aqui, o resumo do que foi publicado pela Revista VEJA. Nós acrescentamos: muitas iniciativas vêm sendo tomadas para atender a esse grande mercado dos idosos ou dos que vivem sozinhos. O Recife é, provavelmente, a cidade do país que têm maior número de clubes de dança e de turismo do país. Na Segunda-feira, temos dois clubes que oferecem festas. Na Terça, são dois também. Na Quarta, já são quatro!, e assim por diante. Por isso, os idosos ou sozinhos, os casais adultos que querem se distrair num ambiente sadio e em horário mais conveniente (porque, em geral, essas festas começam às 16 horas e terminam às 20) têm muitas opções de diversão, de turismo. Em se tratando de Clubes, temos, na Terça feira, dois grandes que reúnem a preferência de muitos adultos: o Clube dos Amigos (que recebe pessoas de qualquer idade, embora seja orientado para o público adulto), e o Clube Emoções, que é para os maiores de 50 anos. Ambos têm suas festas intercalando na Terça-feira, no Clube dos Oficiais da Polícia Militar de Pernambuco, Rua João de Barros, 399, Recife.
INFORMAÇÕES pelo fone 81-3221-2317.
Por outro lado, existe em Pernambuco um empreendimento especial para os adultos que querem viver sozinhos num ambiente seguro e agradável, por reunir em pequenas casas independentes, mas num mesmo condomínio, as pessoas nessa faixa etária. Trata-se do Condomínio Fechado Villa Harmonia, em Igarassu. Lá, numa área de 12,5 hectares, existe já uma pequena comunidade de pioneiros que usam do ambiente de uma granja cheia de fruteiras, com piscina, pista de Cooper, restaurante, luz elétrica, água encanada e telefone. Existem também casas construídas para vender e alugar para fins de semana a preços razoáveis. É uma solução, porque garante a privacidade e a vida em uma comunidade de pessoas que têm os mesmos problemas e procuram solucioná-los.
INFORMAÇÕES: Clubes para adultos e Villa Harmonia – fone 81-3221-2317.