sábado, 10 de abril de 2010

Serra foca em temas sociais, mira nos pobres e evita confronto direto







O primeiro discurso público oficialmente como pré-candidato à Presidência da República mostrou um José Serra com menos números, mais piadas, propositivo, preocupado em se mostrar construtor do diálogo e de continuar conquistas que, segundo ele, são frutos de 25 anos de lutas e "não de um homem, de um governo e muito menos de um partido". O discurso e o lançamento da candidatura são o primeiro passo para nacionalizar a fala do tucano e mostrá-lo como mais preparado para suceder ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.


Serra não polemizou com o presidente, que até recebeu elogios de outros tucanos. As críticas ao PT também foram suavizadas em alguns momentos por caciques sociais-democratas. A estratégia do partido é evitar, pelo menos no início desta campanha, choque e bipartidarismo.


O discurso de Serra mirou também em um eleitor que gosta do presidente Lula, mas não necessariamente manifesta intenção de votar na candidata petista Dilma Rousseff. Enquanto a aprovação do presidente e do governo margeiam os 70%, a intenção de votos de Dilma está na casa de 30%.

Por essa razão, Serra colocou a boa condição do Brasil hoje de crescimento econômico, maior distribuição de renda e diminuição da pobreza, entre outros indicadores como fruto do trabalho de 25 anos, iniciados pelos que lutaram pela redemocratização na campanha das "Diretas Já".

Listando conquistas como o direito a voto, a estabilidade econômica e o avanço em áreas sociais, o ex-governador de São Paulo disse: "Todas (as conquistas) são resultado de 25 anos de estabilidade democrática, luta e trabalho. E nós somos militantes desta transformação".

Serra também aproveitou para dar amostras, ainda imprecisas, de seu potencial esboço de programa. Seu discurso, preparado por ele mesmo e que teve palpites de pessoas próximas ao político, foi recheado de temas que precisariam de atenção especial da máquina pública.

Ele se deteve longamente nos itens educação, saúde, segurança pública e trabalho. Pesquisas internas do PSDB mostram que esses são os assuntos que recebem pior avaliação dentro do atual governo federal. Por isso, quer mostrar ser capaz de lidar com problemas que o governo petista não foi.

Seu discurso também enfatizou o voto das mulheres, dos jovens (mirando principalmente o fato de 20% desse segmento estar atualmente desempregado), os mais pobres e os portadores de deficiência física. Em outro momento, para mostrar que não fala apenas de São Paulo, disse que aprendeu a fazer política "andando pelo país", notoriamente nos Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Pernambuco.

Contrariando uma característica tradicional de sua oratória, Serra usou poucos números em sua fala. Em pelo menos três momentos fez brincadeiras com a platéia. Num deles, chegou a usar uma metáfora futebolística, dizendo que divisão só é boa no campo do esporte e que pessoalmente ele gostava quando havia verdes de um lado e "preto e branco de outro". O governador é torcedor do Palmeiras, cujo principal rival é o Corinthians. A brincadeira se referia as cores das camisas das duas equipes.

Serra também fez gestos de aproximação, dizendo que não jogará o governo contra a oposição, nem irá, caso eleito, olhar para carteira partidária de quem propuser emendas de liberação de verbas. "Sempre olhei para a qualidade, nunca para a filiação", disse.

Essa declaração foi entendida como um gesto de entrada para o PMDB, partido que apóia Dilma Rousseff, mas que vive dissidências internas que podem resultar em migração de apoio para a campanha tucana.

No evento, estavam presentes os presidentes do DEM, Rodrigo Maia, do PPS, Roberto Freire, legendas que já declararam apoio ao tucano. Mas também estavam representantes do PTB, do PSC e do PMN, partidos que hoje integram a base de apoio do governo Lula.

Serra pretende aumentar o escopo de aliados, a fim de garantir tempo maior na propaganda de rádio e televisão e mais palanques e estruturas no Estado. Tanto que o presidente do PTB, Roberto Jefferson, foi tratado com deferência. Jefferson foi autor das denúncias de que o governo federal corrompia aliados, por meio de pagamentos a deputados em troca de votos em temas importantes, um escândalo que ficou conhecido como "mensalão".

Ao final, o deputado disse que teria maioria no partido para assegurar apoio a Serra, mas pretende negociar, sob o risco de criar uma disputa interna na legenda.

O tucano adotou tom por vezes emotivo. Fez uma homenagem a seu pai, um "modestíssimo comerciante de frutas no mercado municipal", que carregou frutas para que ele "pudesse carregar livros".

Ao falar de sua biografia, Serra procurou ressaltar sua origem modesta, cujo crescimento sempre foi vinculado ao trabalho e ao esforço. Também lembrou Zilda Arns, ex-coordenadora da Pastoral da Criança, e Ruth Cardoso, ex-primeira dama, morta em 2008. Ela era casada com Fernando Henrique Cardoso. A menção ao nome da mulher arrancou discretas lágrimas do ex-presidente.

As críticas ao governo apareceram de maneira velada. Em um momento, disse que é necessário preservar o estado de direito no Brasil, nunca afrontá-lo. Em outro, revelou o desejo de que no País as leis sejam aplicadas para todos. "Se o trabalhador precisa cumprir a lei, o prefeito, o governador e o presidente da República também tem essa obrigação. Em nosso país, nenhum brasileiro vai estar acima da lei, por mais poderoso que seja".
Também disse que é necessário ao país defender os direitos humanos "sem vacilações". "Não cultivemos ilusões: democracias não têm gente encarcerada ou condenada à forca por pensar diferente de quem está no governo". Recentemente o presidente Lula foi criticado por estar em Cuba no mesmo dia em que um dissidente do regime implementado por Fidel Castro morria após greve de fome. Lula condenou o uso da greve de fome como instrumento político e defendeu a autonomia cubana para resolução de seus problemas internos.

O ex-governador se preocupou em pontuar suas declarações sempre com a necessidade de união. E terminou com a declaração de que o "Brasil não tem dono".

"Eleição é uma escolha sobre o futuro. Olhando pra frente, sem picuinhas, sem mesquinharias, eu me coloco diante do Brasil, hoje, com minha biografia, minha história política e com. esperança no nosso futuro", disse o pré-candidato, que ainda precisa ser referendado em convenção partidária em junho. Serra agora deve percorrer o País apresentando suas propostas, além de tentar negociar uma ampliação de seus apoios partidários.

Além de saber quem será seu vice, definição que só deve ficar para o mês que vem, segundo o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE). O DEM pede a vaga. Neste sábado, militantes tucanos pediram em coro que Aécio aceitasse o posto, mas o ex-governador de Minas Gerais desconversou.

Pretende com isso ter um final diferente do que teve em 2002, quando numa campanha cheia de problemas acabou sendo derrotado por Lula. Mas já prevê que será uma caminhada "longa e difícil".

Ao final de sua fala, a primeira peça publicitária mais concreta de sua campanha. Um jingle em que mostra que Serra é do bem e que não tem contra-indicação numa alusão indireta aos adversários, mas já buscando também atar sua imagem à da gestão da Saúde.

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