Para mim é um tanto delicado falar em comemoração num dia como hoje, onde todas as escolas, instituições de ensino, empresas públicas e privadas, festejam solenemente o dia 22 de Abril de 1500 e, além disso, comemorar o dia da Terra. É uma história de tanta dor e de tantos desatinos que me parece desconfortável confraternizar dadas que deveriam ser honrosas na vida de qualquer cidadão brasileiro e cidadão do mundo, consequentemente.
O Brasil faz hoje 510 anos de invasão portuguesa. Foram as árvores de cor rubra que instigou os portugueses a firmarem domínios em terras já habitadas. O pau Brasil foi responsável por nos dar o título de “Brasileiro”. Foi o pau Brasil que incentivou o progresso das feitorias, o crescimento das vilas e o fortalecimento da administração pública de Portugal.
A árvore que nos deu um nome, a árvore que deveria ser o símbolo de um país que se vangloria de ser o berço do verde mundial, desde o início do seu tráfico restou somente 3% de Floresta Atlântica e, por consequencia, convivemos até hoje com o desmatamento indiscriminado que coloca em perigo nossa biodiversidade.
Atualmente, a espécie (com nomes diversos: ibirapitanga, orabutã, brasileto, ibirapiranga, ibirapita, ibirapitã, muirapiranga, pau-rosado e pau-de-pernambuco) está tão ameaçada quanto diversas outras que povoam a Mata Atlântica, que apesar de ser um dos ecossistemas de maior diversidade é também um dos mais ameaçados do planeta.
E o dia da Terra? Temos realmente algo para comemorar no Dia da Terra? Esse dia foi criado em 1970 quando o Senador norte-americano Gaylord Nelson convocou o primeiro protesto nacional contra a poluição e, desde 1990, outros países passaram a celebrar a data.
No livro “Colapso como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso”, o geógrafo Jared Diamond nos conta com dados históricos e científicos como ocorreu o “eco-suicídio” de grandes civilizações, isto é, as que exploraram em excesso os recursos naturais, movidos pela necessidade ou pela imprevidência, caminharam para o fracasso e sua total extinção.
Ao contrário daquelas que entenderam a tempo que a continuidade da vida estava intimamente associada às suas capacidades de se adaptarem às mudanças. Sociedades que souberam cuidar dos seus recursos naturais foram mais bem sucedidas ao se antecipar às alterações climáticas e ambientais de modo a conseguir sobreviver a elas.
Em um dos seus mais belos artigos, quando ainda era Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva sinalizou:
“Agride-se a Terra porque ela é vista apenas como fonte e suporte de bens para o mercado; destroem-se pessoas porque são vistas apenas como consumidoras e contingentes geopolíticos. Não sem razão o petróleo é um personagem tão destacado nas guerras presentes e passadas no Oriente Médio. Também não sem razão as causas ambientais cada vez mais se confundem com seu espelho social e ético. Hoje procuramos soluções socioambientais, não só ambientais. Falamos em justiça ambiental como parte intrínseca da justiça social. A qualidade de vida é direito humano, assim como a saúde, a educação, a habitação. E acumulam-se evidências de que a atividade econômica não precisa ser predadora. É desejável, viável e factível o caminho do desenvolvimento sustentável”.
E o que dizer do país que canta no seu hino “teus risonhos, lindos campos têm mais flores” e “nossos bosques têm mais vida”, onde um bando de deputados federais do agronegócio quer derrubar o código florestal, a única lei que ainda garante que não seja destruído o pouco que restou das nossas florestas e matas ciliares!?
Mas, esperem?
O que estamos comemorando hoje mesmo?
"Vamos celebrar o horror de tudo isso com festa, velório e caixão", diria Renato Russo.
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