terça-feira, 26 de abril de 2011

O trem da alegria dos laboratórios‏

Foto: Divulgação

Interfarma banca viagem aos EUA para 18 deputados federais.

Saraiva Felipe (PMDB),
 Manuela D’Ávila (PC do B) e
Cândido Vaccarezza (PT) estão na comitiva
 projetos que prejudiquem a indústria farmacêutica não avançam na Câmara



Rodolfo Borges
de Brasília

Desde a aprovação de Lei de Patentes, em maio de 1996, a indústria farmacêutica brasileira não perde uma briga no Congresso Nacional. As patentes de segundo uso (aplicadas quando se descobre uma utilização nova para um remédio antigo) continuam valendo mesmo sem estarem previstas em lei, a Anvisa (Agência de Vigilância Sanitária) já não pode impedir a concessão de patentes e os inibidores de apetite estão livres para a venda.

A garantia de tudo isso responde pelo nome de Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa), maior representante do setor no Parlamento brasileiro e patrocinadora, nesta semana, de uma comitiva de 18 parlamentares aos Estados Unidos. A Interfarma e o Brazil Institute bancaram uma missão para que os parlamentares conhecessem o desenvolvimento técnico da indústria farmacêutica.

A Mesa Diretora da Câmara dá conta de que apenas cinco parlamentares tiveram os custos bancados pela Interfarma, mas o deputado Geraldo Resende (PMDB-MS), presente à comitiva, postou em seu Twitter na segunda-feira 18 a seguinte mensagem: “Somos 18 parlamentares convidados pela Interfarma em Missão Parlamentar, sem gasto para os cofres públicos”.

Os cofres públicos só não permanecem intactos porque o líder da missão, Saraiva Felipe (PMDB-MG), que preside da Comissão de Seguridade Social, se preocupou com a má repercussão de seu envolvimento com a indústria farmacêutica e solicitou (e teve) a viagem custeada pela Câmara. “A indústria farmacêutica sempre atuou muito dentro do Congresso Nacional”, disse ao Brasil 247 o deputado Dr. Rosinha (PT-PR), que se estabeleceu na Câmara como um dos únicos representantes do frágil polo de oposição ao mercado de medicamentos.

Dr. Rosinha diz que, desde que está na Câmara, e é desde 1999, os projetos de lei que apresentam ameaça à indústria farmacêutica enfrentam dificuldade para tramitar e, mesmo quando conseguem algum avanço, não chegam ao fim bem sucedidos. Não há nada que proíba os parlamentares de aceitar o convite da Interfarma para visitar Washington e Boston.

O Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara fala apenas que os deputados não podem receber vantagens indevidas. Um Projeto de Resolução de 2007 apresentado pela deputada Sueli Vidigal (PDT-ES) sugere especificar ente as “vantagens indevidas” no Código de Ética “viajar em aviões privados pagos por amigos ou empresas”. A proposta não avança desde abril de 2009.

Se não é irregular, a relação harmoniosa entre Interfarma e parlamentares pelo menos ajuda a entender a confortável situação da indústria farmacêutica no Parlamento. Talvez o mais problemático da atuação da associação seja a falta de equilíbrio, devido à ausência de parlamentares que garantam um contraponto à altura.

De acordo com a Câmara, o Brazil Institute e a Interfarma bancaram as viagens de Renato Molling (PP-RS), Duarte Nogueira (PSDB-SP), Manuela D’Ávila (PCdoB-RS), Geraldo Resende (PMDB-MS) e do líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP). O deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS)(Frente Parlamentar das Hepatites) não consta como membro da missão, mas acompanha os deputados na viagem, como registrou em seu microblog.

Boa parte desses deputados, que visitaram o Wilson Center e o Massachusetts Institute of Technology (MIT) e atenderam a um seminário de inovação técnica, pesquisa e competitividade, contou com doações da Interfarma em suas campanhas às eleições de 2010. Manuela D’Ávila, Cândido Vaccarezza, Renato Molling e Darcísio Perondi estão na lista dos 13 parlamentares que a associação contribuiu para eleger. A Interfarma doou R$ 1,8 milhão para as campanhas de 20 candidatos. A associação também doou para a campanha ao Senado do ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel.


Contas em questão

O Ministério Público Eleitoral (MPE) solicitou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no início do ano a rejeição das contas de cinco deputados do Rio Grande do Sul por conta das doações da Interfarma, apesar de o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) tê-las aprovado – além dos três deputado gaúchos mencionados acima, estão Onyx Lorenzoni (DEM-RS) e Osmar Terra (PMDB-RS).

Os motivos foram as doações da Interfarma. No entendimento do MPE, a Interfarma é uma entidade representativa dos laboratórios farmacêuticos e defensora dos interesses de seus associados, o que não lhe permitiria fazer doações. Em sua apresentação na internet, a Interfarma diz representar “cerca de 55% do faturamento do segmento farmacêutico, o equivalente a R$ 18,5 bilhões, e geram mais de 23 mil empregos diretos.”

Para o TRE, contudo, a Interfarma pode doar, por não ser considerada entidade de classe, pois não é subsidiada pelo Poder Público ou representa obrigatoriamente os interesses profissionais, sociais ou econômicos de seus congregados. Apesar da discordância, a rejeição das contas não tem qualquer influência sobre o resultado das eleições, ou seja, os mandatos dos candidatos envolvidos não estão sob ameaça.

O presidente e porta-voz da Interfarma, Antônio Britto, foi procurado para comentar a atuação da associação no Congresso Nacional, mas, por também participar da viagem aos Estados Unidos, não conseguiu responder aos questionamentos da reportagem.

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