A Organização dos Estados Americanos - OEA - revogou a medida de 1962 que suspendia a participação de Cuba de suas reuniões. A resolução abre caminho para o retorno do país ao organismo, mas deixa claro que o processo depende de Cuba, que não tem interesse.
A OEA anunciou ontem a revogação, por consenso, da medida de 1962 que suspendia a participação de Cuba nas reuniões do organismo por suas orientações marxistas, apagando do mapa uma das mais simbólicas medidas da Guerra Fria.
Na primeira grande negociação diplomática do governo do presidente Barack Obama com os países da América Latina, ocorrida na cidade de San Pedro Sula, em Honduras, a equipe diplomática dos EUA cedeu em resposta aos acenos de diálogo e mudanças na ilha.
A resolução aprovada pela Assembleia Geral da OEA abre caminho para a volta de Cuba ao sistema interamericano, mas uma cláusula deixa claro que "a participação do país será resultado de um processo de diálogo iniciado a pedido do governo de Cuba e em conformidade com as práticas, propósitos e princípios da OEA".
Por "princípios da OEA", diz a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, entenda-se: princípios democráticos.- Cuba pode voltar para a OEA no futuro se a OEA decidir que a sua participação atende aos propósitos e princípios da organização, incluindo democracia e direitos humanos.
Muitos países-membros procuravam levantar a suspensão de 1962 e queriam que Cuba voltasse imediatamente, sem condições. Outros concordavam conosco que a abordagem correta era trocar a suspensão, que já não atingia seus propósitos depois de quase meio século, por um processo de diálogo e uma decisão futura que garanta que o país se compromete com os valores da organização - disse Hillary.- A Guerra Fria acabou neste dia em San Pedro Sula - comemorou o presidente hondurenho, Manuel Zelaya.
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, também comemorou a decisão: - Foi um grande triunfo, sem dúvida, mas não é suficiente. É só o ponto de partida de uma nova era, porque a OEA está ali com seus mecanismos intactos, o imperialismo intacto.
Apesar de todo o otimismo sobre a histórica decisão, cabe a Cuba fazer o próximo movimento e pedir sua entrada na OEA. Algo que, a julgar pelas declarações do ex-presidente Fidel Castro, não vai acontecer. Horas antes da decisão, em artigo publicado na imprensa estatal intitulado "O cavalo de Tróia", Fidel acusou o organismo de ser "cúmplice dos crimes dos Estados Unidos" contra Cuba. "É ingênuo crer que as boas intenções do presidente dos EUA, Barack Obama, justifiquem a existência desta instituição", disse o líder cubano em seu artigo.
Já o diretor para Assuntos do Continente Americano do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, Dan Restrepo, diz que Cuba "terá que engolir os anos que passou criticando a OEA e pedir para entrar no organismo":- Se e quando isso acontecer, o país terá um caminho a percorrer até que integre a organização, e isso significa obedecer aos princípios que regem hoje os 34 países-membros do continente, como a garantia de autodeterminação de seus povos, democracia, obediência aos princípios de não intervenção, desenvolvimento e segurança.
Foram dois dias de intensas e desorganizadas negociações, e muitos chanceleres, como a própria Hillary Clinton e o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, sequer tiveram tempo de discursar, deixando o resultado final nas mãos de seus negociadores, que passaram o dia de ontem discutindo o texto final.A decisão da OEA provocou imediata reação no Congresso americano, especialmente entre os republicanos.
Um grupo de seis deputados (cinco republicanos) apresentou um projeto de lei em que propõem a suspensão das contribuições dos EUA à OEA (e que representam 60% do orçamento da instituição) caso Cuba seja readmitida sem reformas democráticas. "Em vez de deixar Cuba retornar ao organismo, a OEA deveria considerar a expulsão da Venezuela de Hugo Chávez também", disseram os congressistas.- Este é um dia triste para os defensores dos direitos humanos e civis, presos políticos e jornalistas independentes que lutam pacificamente por uma Cuba democrática - disse o senador americano Robert Menendez.
Gilberto Scofield Jr.
DEU EM O GLOBO
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