domingo, 18 de julho de 2010

Nem sempre uma imagem fala… tampouco mil palavras…


PREFEITURA DE PALMARES. FOTO: RICARDO VIEIRA.



PREFEITURA DE ÁGUA PRETA. FOTO: RICARDO VIEIRA.




PREFEITURA DE BARREIROS. FOTO: RICARDO VIEIRA.





Após um mês do início das enchentes atingirem as cidades de Palmares, Água Preta e Barreiros, a impressão que tenho é de que estamos muito longe de ver a limpeza está completa, o comercio funcionando normalmente, as famílias em suas casas, as igrejas levando a palavra, as escolas orientando…

Há poucos instantes cheguei da cidade de Palmares, em mais um domingo servindo a população local, através do “Comitê Ecumênico de apoio às vítimas das chuvas em Pernambuco”. A nossa casa na cidade é no Colégio Nossa Senhora de Lourdes que é dirigido pelas Irmãs da Congregação Franciscana de Nossa Senhora do Bom Conselho. É lá que se concentram grande parte das doações e onde a maioria das pessoas que precisaram de ajuda encontrou consolo das irmãs, especialmente da Irmã Geovana, que trabalha incansavelmente em nome da caridade.

Os finais de semana das minhas férias foram, graças a Deus, dedicados ao serviço voluntariado, ao lado de pessoas como Irmã Geovana, o espírita e amigo Augusto, o Pastor Anglicano e querido amigo Sérgio; de voluntários outros como o casal Gisele e André, a professora Daniela e a aluna Jéssica (ambas de Palmares) e a tantos outros irmãos que dedicaram um pouco do seu tempo para ajudar ao próximo.

Tudo que eu vi, nestes dias que trabalhei nas cidades, marcaram significativamente a minha memória, o meu coração. As primeiras imagens da cidade, quando lá cheguei, ao lado da amiga Gleizy Gueiros, são impressionantes. Registrei com centenas de fotos, mas, nem sempre uma imagem fala mais que mil palavras… tampouco mil palavras dizem o que eu presenciei. Portanto, não vou me esforçar pra reproduzir aqui os meus sentimentos.

Porém, é importante registrar algumas impressões minhas.

Eu vi muita gente pobre, sem condições financeiras, ajudarem outros, em momento que poderiam está se lamentando de terem perdido tudo que possuíam. Uma adolescente, de 17 anos, me disse, enquanto me ajudava como guia:

“- Eu estou muito feliz por está ajudando as pessoas. Não adianta reclamar porque a gente sempre acha uma pessoa em situação pior que a minha…”




Eu vi muita gente que nunca colocou os pés no chão, de classe média alta e ricos, chegarem no portão das Escola das irmãs e dizer:

“- Estamos com uma comitiva de Boa Viagem que trouxe muitos mantimentos e queremos saber em que podemos ajudar…”




No dia em que conheci Irmã Geovana, foi marcante. Ouvimos os relatos dela, de como abriu os portões da escola para os desabrigados, de como assistiu as águas arrastarem um caminhão até ele bater e derrubar parte do muro da escola. Mas, um relato em especial, fez minha imaginação viajar:

“- Eu me assustei quando vi um carro parado na frente do portão. A água cada vez mais forte. Dentro do carro, uma família: marido, esposa e dois filhos. Aproximei-me do portão, abri e fiz sinal eles entrarem. Quando eles desceram do carro eu perguntei há quanto tempo estavam ali e eles disseram que há mais de uma hora. Então eu perguntei por que eles não bateram no portão. A mulher, chorando, me explicou que temeu pedir abrigo por ser espírita. Ora, disse eu a ela, jamais fecharia as portas da minha casa pelo fato de você ser de outra religião". (...)

A escola das irmãs Franciscanas chegou a abrigar mais de dez famílias, de todos os credos, de todas as classes sociais, de todas as opções sexuais…


No sábado, 03 de Julho, quando eu ajudava a distribuir alimentos e água no bairro Alto da Saúde, acompanhado por uma agente comunitária de saúde, a qual conhecia a todos, por trabalhar há 19 anos no bairro, eu vi uma cena que me chocou.

A distribuição dos donativos era complicada porque as pessoas queriam avançar contra a gente. Eu cheguei a ser mais ríspido com um homem numa moto porque ele queria levar a força os donativos. Quando paramos em frente ao cemitério, a cena dolorosa.

Uma senhora, com rosto encarquilhado, cabelos ao desalinho amarrados com um pedaço de pano, lábios finos, boca sem dentes, e um choro superabundante. Ela me olhava, encostada no portão de entrada do cemitério. Aproximei-me devagar, sem perder de vista nenhum gesto daquela senhora desesperada. Quando fiquei diante dela, me disse, entre lágrimas:

“- Meu “fí”, me dê uma cesta dessa pra mim. Eu perdi tudo. Meu marido é cego. A gente ta morando aqui no “sumitero” até quando deus quiser. Me dê meu “fí”‼! (…)




Em Água Preta, o padre Tadeu abrigou boa parte dos 750 desabrigados em sua paróquia e na sua própria casa. Um homem muito doce, ativo, alegre, firme. Dele escutamos palavras de ordem, de fé, de esperança. Padre Tadeu se dispôs a articular um comitê com pastores protestantes a fim de amparar de forma organizada a todos os atingidos.



Na cidade de Barreiros, um pastor da igreja batista (não me recordo o nome), nos deu um grande exemplo de homem responsável e fiel aos princípios que declama em suas pregações. Quando a água atingiu a casa onde mora com a família, correu pra igreja, que já estava completamente lotada de gente, abrigada por ele mesmo, no início da enchente. A sua mulher, em momento de desespero lhe implorou para irem embora pra Recife, para casa de parentes de ambos. Ele respondeu pra ela:

“- Nós vamos ficar aqui. Eu sou líder dessa comunidade religiosa e eu vou ficar do lado deles. Vamos dividir com todos eles as mesmas dores, as mesmas necessidades. Eu não posso abandonar as minhas ovelhas!”

O pastor, que ontem encontramos mais aliviado ao lado da esposa e filhos, contrariando as pessoas de posse da sua igreja, foi exemplo, é exemplo de homem que entende o significado do verbo servir. Servir ao próximo, como o Mestre Jesus recomendou.



O que eu aprendi com tudo isso?


Bem, vou passar um bom tempo pensando em como ser melhor, na minha casa, no meu trabalho, no trato com meus familiares, amigos, colegas e alunos, sem deixar-me atormentar pelo lixo mental que vem de quem pensa ou fala mal do que sou ou não sou. Eu quero ser firme se precisar, porém, sempre me alimentando com muita moderação. Tenho que lembrar que muita gente confia na minha reserva analítica e na minha vontade de aprender a fazer e viver diferente.

Também aprendi que simplificar a vida é focar em coisas, fatos, pessoas e situações que realmente sejam significativas porque nos impulsionam pra nossa missão de uma forma mais integrada, segura, leve, repleta de sentimentos capazes de nos conectar com o que de melhor possa existir na humanidade... E olhem meus amigos, há muita coisa boa acontecendo mundo afora!

Por fim, o trabalho dos últimos dias me renovou as crenças e trouxe preciosas lições pra minha vida. “Saber servir é um arte esquecida por muitos...” Penso que recebo tanto da vida, apesar de não achar que mereço, que às vezes sinto até medo de não terminar tanta coisa que tenho pela frente.

Fiz pouco em relação a muitos que continuam ajudando diariamente nas cidades atingidas. Mas, pelo menos, mais uma vez eu coloquei em prática um belo ensinamento de Paulo de Tarso (que não é meu amigo querido), que disse: FÉ SEM OBRA, É MORTA!

0 comentários:

Postar um comentário