A diferença no
desempenho entre as escolas públicas e privadas está muito mais na bagagem dos
alunos do que na qualidade do ensino
O número de matrículas
na educação básica no Brasil diminuiu nos últimos 10 anos. Em 2002, eram 54,7
milhões, contra 50,9 milhões em 2011. O ensino privado, por sua vez, seguiu uma
lógica contrária e ampliou a quantidade de alunos no mesmo período - as
inscrições nessas instituições passaram de 6,8 milhões para 7,9 milhões. Mas,
mesmo com o aumento nas turmas, os pais devem estar atentos e serem criteriosos
na hora da escolha. A diretora executiva do movimento Todos pela Educação,
Priscila Cruz, alerta que escola privada não é sinônimo de ensino de qualidade.
Embora uma parcela da
população possa ter como lema "se é pago, é bom", Priscila avalia que
o conhecimento agregado tanto por instituições públicas quanto por particulares
é o mesmo. A diferença está na bagagem cultural e no contexto socioeconômico de
cada aluno.
A professora de
pedagogia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Maria Marcia Malavasi
diz que os frequentadores de uma escola privada geralmente têm mais acesso a
livros e programas culturais, como ida a museus, teatros e cinemas. "As
escolas particulares recebem os melhores alunos, com mais oportunidades",
analisa.
Com isso, eles chegam
com um acúmulo de conhecimento superior ao dos alunos de escola pública e,
consequentemente, criam um capital cultural maior. Mas isso não significa que a
privada seja melhor, pelo contrário. Sem o fator socioeconômico, Priscila
afirma que o resultado de ambas seria equivalente, e a transferência de uma
escola pública para uma privada é o mesmo que trocar seis por meia dúzia.
"Há uma falsa percepção de que escolas particulares são mais
eficientes", explica a diretora.
Nem o desempenho
inferior das públicas na medição do Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica (Ideb) deve ser encarado como uma informação final e absoluta. No ano
passado, a divulgação do Ideb 2011 mostrou que as escolas privadas atingiram
índice de 6.5 nos anos iniciais do fundamental, 6.0 nos anos finais e 5.7 no
ensino médio, enquanto as públicas ficaram com 4.7, 3.9 e 3.4 respectivamente
(segundo as médias de todo o País). Priscila frisa a importância de relativizar
o desempenho das instituições.
Em um exercício de
imaginação, a diretora do movimento Todos pela Educação sugere que os alunos,
preservando suas condições socioeconômicas, fossem trocados de escola. A
transferência colocaria os menos favorecidos em instituições particulares,
enquanto crianças e adolescentes com maior contato com cultura e educação
diariamente estudariam em colégios públicos. Nesse cenário, o melhor Ideb
acompanharia a inversão, e a pior nota apontaria para as particulares.
Particulares estão
abaixo da meta do Ideb
Ao analisar a evolução
das escolas particulares no Ideb, é possível perceber ainda que essas
instituições, conforme a média brasileira, foram as únicas que não atingiram a
meta projetada para 2011. Todas as outras chegaram ao objetivo estabelecido, em
alguns casos inclusive antecipando a meta de 2013. O quadro pode ser analisado
de duas maneiras. Por um lado, quanto melhor é o desempenho de uma escola no
Ideb, mais ele tende à estabilidade.
Priscila explica que
cada ponto é um avanço bastante sensível, mas a evolução em cima do que já foi
conquistado se torna mais lenta. "Por terem resultados maiores, fica cada
vez mais difícil subir na pontuação e atingir metas que são crescentes. Não é
desejável, mas é de se esperar que elas não estejam cumprindo as metas",
afirma.
Por outro lado, a
professora Marcia aponta que, mesmo com um índice alto, essas instituições têm
um rendimento inferior a escolas de outros países. "O Brasil é
subdesenvolvido em termos de educação. Não há qualidade de ensino e de vida.
Tem poucos museus e bibliotecas, e as crianças não têm hábito de leitura",
avalia.
Outro mito em relação
às escolas particulares é o de que os educadores têm melhor instrução. "Os
professores são formados pelas mesmas instituições", assegura Priscila. A
diretora do movimento ressalta que o problema da formação inicial, com
qualidade aquém do esperado, se estende tanto para profissionais de
instituições públicas quanto privadas. Além disso, a questão depende também do
desempenho individual. "Não podemos dizer que todos os professores são
bons ou ruins", alerta Marcia.
A professora aponta
ainda que a educação privada também carece de investimentos em projetos
pedagógicos - bons modelos não são uma regra nessa área, opina Marcia. A
vantagem dos colégios pagos está na facilidade de gestão. Diretores podem
oferecer uma remuneração mais atrativa, além de bonificações ou financiamentos
para cursos de especialização.
Desempenho depende mais
do aluno do que da escola
Não é só pela qualidade
que os pais costumam procurar escolas particulares. Eles estão de olho na
segurança dos filhos - uma questão que, de fato, procede, na visão de Priscila
- e, por que não, no status social que isso confere. Mas, em termos de
educação, eles precisam ter em mente que a matrícula em uma escola privada não
garante uma boa média no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou uma aprovação
em vestibular. Mesmo que a instituição tenha uma boa avaliação de qualidade, a
dispersão de resultados dentro de uma mesma escola é alta, com alunos
excelentes e outros com desempenho menor. "Depende do esforço de cada
um", ressalva Priscila.
O esforço individual é
o que faz com que bolsistas de baixa renda, por exemplo, se beneficiem do
ensino privado, segundo o que a diretora do movimento Todos pela Educação cita
como efeito dos pares: apesar do baixo repertório cultural, o estudante
consegue ir bem nas aulas pela influência do conhecimento dos demais.
"Quando alunos em peso têm esse repertório baixo, é mais difícil",
detalha. A professora Marcia, por sua vez, é mais cautelosa. Para ela, quando
uma escola recebe um aluno com um índice socioeconômico menor, a tendência é
que o trabalho realizado obtenha resultados lentamente.
Na hora de matricular
os filhos em uma instituição privada, os pais precisam estar atentos ao uso que
as escolas fazem das notas obtidas em exames e vestibulares. Mas, assim como
isso pode ser uma credencial de qualidade, também pode ser uma propaganda
enganosa. A avaliação dos pais deve ocorrer, destaca Priscila, pelo que a
escola pode oferecer para o crescimento daquele estudante, sabendo que certas
instituições podem ser caras e ter qualidade duvidosa - muitas vezes, até mesmo
com um ensino mais pobre do que as públicas.
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