sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Alunos alienados, Professores desesperados e a Vulgarização da Música nas Escolas



O mestre disse a um dos seus alunos: tu queres saber em que consiste o conhecimento? Consiste em ter consciência tanto de conhecer uma coisa quanto de não a conhecer. Este é o conhecimento.


Confúcio.




Eu fui aluno do antigo ensino primário numa época em que o Brasil vivia o regime militar. Terminei o quarto ano primário aos 9 anos, no ano de 1982. Além das matérias da grade comum, tínhamos aula de Inglês, teatro, dança e música.

As aulas de inglês eram dadas por uma professora que chamávamos de Dona Bibiu e os livros eram em número de seis. Um livro de exercícios, um de leitura e conversação e mais quatro outros com conhecimentos gerais aplicados pelo estudo da língua. Eu na 4ª série lia obras de Shakespeare. Conhecíamos sobre a cultura de diversos países do mundo, cantávamos e representávamos as peças do mestre dramaturgo inglês.

Antes de nos dirigirmos às salas de aula, todos se reuniam num imenso salão. Havia um palco em granito onde os todos os professores ficavam para darem as orientações do dia. Havia a diretora (que não me recordo quem era) e havia um “sensor” que cuidava da disciplina da escola. Desse eu lembro o nome porque o filho dele era meu melhor amigo. Um senhor de voz postada, vibrante, cabelos grisalhos, óculos preto de armação grossa. Chama-se Seu Cecé. Cantávamos os hinos Nacionais e de Pernambuco. Orávamos Ave Maria e o Pai Nosso para em seguida sermos liberados para as nossas respectivas salas.

Além da matéria em sala de aula, “Moral e Cívica” era vista na prática, nos corredores do colégio. As comemorações religiosas e do calendário oficial eram todas vividas pela escola. Na época do carnaval, havia frevo de rua, Capiba, Claudionor Germano, Alceu Valença, Elba Ramalho, Moacir Franco. Havia concurso de máscaras, de fantasias e a “manhã de sol” que sempre era realizada no Clube Estrela. No são João o forró do Rei do Baião era lei. Jorge de Altinho, Alcymar Monteiro, Marines e Sua Gente, Acisão e até Sandro Breker embalavam as quadrilhas juninas, sem modismos, sem compromisso com a estilização. Apenas vivíamos os festejos juninos tipicamente nordestinos. E o natal era a celebração da paz entre todos os homens. Estas as maiores festas do ano letivo da nossa escola.

Saudosismo? Reminiscências de um tempo que não volta mais? Comparatismos entre épocas distintas e distantes?

Talvez sim. Talvez não.

Estas são imagens que jamais se apagaram da minha mente de aluno. E hoje, como professor, vejo quanta coisa mudou. Quantos valores foram sendo substituídos. Quantas coisas foram perdendo o sentido em detrimento ao afrouxamento daquilo que chamávamos de “disciplina”, de “civismo”, de “valorização”, de “respeito”. Parece que tudo que para mim fazia sentido, hoje é visto como ultrapassado, arcaico, obsoleto.

É certo que muitas conquistas foram alcançadas. Muito se sabre sobre a nossa história. Muito se explica do que hoje somos enquanto povo. O Brasil é um país plural. Composto por uma variedade de culturas que historicamente o constituíram, e que o constituem diariamente. Portugueses, índios de várias tribos e nações, negros escravos oriundos de diferentes regiões da África, imigrantes de diversos países da Europa, japoneses, entre outros, foram compondo o nosso mosaico cultural – com seus costumes, suas formas de ser e de pensar o mundo.

A grande extensão do nosso território, com sua variedade de relevo, vegetação, clima e atividade econômica, favoreceu ainda mais a diversidade social e cultural. Por isso, buscar um só Brasil de norte a sul, leste a oeste, é simplificar, reduzir e calar suas múltiplas vozes. No entanto, muitos valores culturais da nossa região, muito da identidade musical artística do povo pernambucano tem sofrido ataques de intrusos que infelizmente aparecem com os modismos e entorpecem as mentes dos nossos alunos.

Esta constatação é feita por diversos educadores pernambucanos. Não estou inventando a roda, claro. Eu me recordo que este ano, durante a minha primeira festa de carnaval na Escola Cônego Eugênio Vilanova, tomei consciência mais apurada de eu realmente estou ultrapassado e meus valores musicais e culturais mais ainda.

Eu me atrevi a colocar um cd ao vivo de Alceu Valença com canções de frevos que ele faz como poucos fizeram até hoje. Não durou uma música. Uma aluna, acompanhada por uma professora, chegou diante de mim e disse:
- Tire essa música professor. Isso é coisa de velho. Ninguém ta gostando “disso”, não!
E a professora endossou:
- A galera quer ouvir marreta “you planeta”!

(sem comentários).

Hoje, 16 de outubro, uma determinada Escola da zona rural comemorou a festa das crianças. Pasmem. A música tocada foi da banda “Djavu”. Confesso desconheço a banda. Quando soube, resolvi procurar no bom e velho Google a tal da banda. No site do YouTube eu encontrei um vídeo da música “Não desliga o telefone”. Ao ouvir a letra da música, como diria seu Lunga, “Meu deu tudo o que não presta”.

Isto é música de se colocar em festa do dia das crianças (de idade escolar primária, em formação), ainda mais dentro de uma escola? E o pior: todo o incentivo e integração foram feitos pela direção da escola. Que tipo de energia, de sensibilização e de emoção estava sendo colocada a tona numa festa exclusivamente infantil?

No meu tempo, ouvíamos Sergio Malandro, Trem da Alegria, Balão Mágico, Abelhudos, Mara Maravilha, Xuxa, Juninho Biu, Dominó, as canções dos personagens como os palhaços Bozo e Carequinha...


Em uma das reportagens maravilhosas da Revista Nova Escola, a manchete trazia: “Trabalhar com música na pré-escola melhora a sensibilidade, o raciocínio lógico e a expressão corporal de seus alunos. E eles vão achar que é pura brincadeira”.

A matéria explicava que a música ajuda a afinar a sensibilidade de seus alunos, aumenta a capacidade de concentração, desenvolve o raciocínio lógico-matemático e a memória, além de ser um forte desencadeador de emoções.

Não é preciso ser um cientista, um grande pesquisador teórico para saber que a música é, reconhecidamente, uma espécie de modalidade que desenvolve a mente humana, promove o equilíbrio, proporcionando um estado agradável de bem-estar. Por seu poder criador e liberador, a música torna-se um poderoso recurso educativo a ser utilizado na Pré-Escola que refletirá para o resto de sua vida. A música deve estar tão unida às classes menores, como as flores, as gravuras e as histórias.

Eu sempre defendi a música como ferramenta de aprendizagem e sensibilização dentro da sala de aula. Não só nesse aspecto, mas, também, dos pontos de vistas psicológicos e históricos, sempre encarei a música como aliada da relação entre professor e aluno, em qualquer série ou nível.

Eu entendo que a educação física desenvolve o físico enquanto a música desenvolve a mente, equilibra as emoções proporcionando paz de espírito, na qual o indivíduo pode melhor concentrar em qualquer campo de pesquisa e do pensamento filosófico.

A Universidade da Califórnia em Irvine descobriu que após seis meses tendo aulas de piano, crianças pré-escolares tiveram desempenho 34% melhor em testes de raciocínio tempero-espacial que aquelas que não tiveram, nenhum treino ou aquelas que tiveram aulas de informática.

Pesquisadores acreditam que a música é uma forma superior de ensinar os estudantes primários o conceito de frações. Crianças que estudam música saem-se melhor na escola e na vida, normalmente recebem notas mais altas nos testes de aptidão escolar.

Alunos adolescentes, em colégios com regime de internato, que estudaram música obtiveram 52 pontos mais na parte verbal de seus testes de aptidão escolar e 37 pontos a mais em matemática (89 pontos combinados) que aqueles sem instrução em música.

Platão disse uma vez que a música é “um instrumento educacional mais potente do que qualquer outro”. Agora os cientistas sabem por quê. A música, eles acreditam, treina o cérebro para formas superiores de raciocínio. Será que estas pesquisas foram feitas com musicas de bandas como Marreta You planeta e Dejavú?

No tempo do grande compositor Heitor Villa-Lobos foi introduzida na grade curricular a disciplina de música nas escolas do Brasil. Naquele tempo as crianças cantavam e formavam o Grande Coral apresentando-se em estádios de futebol, centros de convenções e outros especialmente em datas cívicas. Por motivos alheios aos mestres da música, tal disciplina foi mudada para Educação Artística, matéria com várias artes incluindo a música.

Assim a música foi ficando de lado, pois, a maioria dos professores com pouco ou nenhum conhecimento de música, contribuído para a extinção do departamento de música nas escolas e colégios.

O que aconteceu?

O rendimento escolar caiu e o problema de disciplina e de drogas nas escolas aumentou. Segundo um estudo conduzido na Universidade do Texas, alunos de música em idade escolar têm menos problemas com álcool e drogas, são emocionalmente mais saudáveis e se concentram melhor que seus colegas não músicos.

Vendo toda a problemática acima descrita percebemos que já é hora de entendermos a importância de incluirmos músicas que acrescentem valores de paz, se harmonia, que corroborem com o desenvolvimento do ser, do espírito e do cidadão. E isso não é saudosismo.

Por fim, questionamos:

Qual é o papel da escola na formação musical de seus alunos?

Como formar introduzir "música de qualidade" na vida dos alunos, esquecendo dos nossos gostos pessoais?

Quais as músicas que devem ser trabalhadas para cada nível escolar?

É importante resgatar canções de compositores locais e regionais?

Qual a relação entre música e cultura e como explicar isso aos alunos?

E, afinal, o que é música?

1 comentários:

Gostei muito da matéria. Sou jovem de 16 anos e não consigo entender o sentido dessas músicas de hoje. Lendo o seu tempo de infância na escola me fez pensar na diferença que é hoje. Meu pai também estudou nesta época e ele sempre disse que hoje as pessoas não estudam mais e sim brincam de estudar. É bom saber que ainda existem pessoas conscientes e de bom gosto.

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