quinta-feira, 15 de outubro de 2009

A QUEM EDUCA




Educa quem educará. E quem aprender a perder: Quem cuja obra permanecer muito depois do momento de educar. Educar é perder as batalhas do imediato. Menos a do amor.
É abrir mão da pretensão do reconhecimento e saber que quando vier – se vier – já tempo não haverá para receber o agasalho de sua manifestação. É aceitar perdurar apenas na lembrança.
É perder porque, em qualquer sistema o verdadeiro educador estará ameaçando algo, até mesmo tudo em que acredita. O verdadeiro educador é o que acompanha as mutações da vida, dos tempos, dos comportamentos.
É quem logo vê o abismo de imperfeições implícito no próprio ato de educar. Sabe que educar é educar-se a cada dia. E é ser capaz de eqüidistância de esquemas, sistemas ou fórmulas infalíveis, ilusões de verdade últimas das coisas.
Educo hoje com valores adquiridos ontem, pessoas que são o amanhã. Os valores de ontem, percebo alguns. Dos de amanhã não sei. Educo com os de ontem (os de minha formação?). Perderei os hoje e os amanhãs.
Educo com os de hoje? Perderei o que havia de sólido nos de ontem e nada farei pelo de amanhã, que serão outros. Educo com os de amanhã? Em nome do quê? Da minha precária maneira de conceber um amanhã que escapa pelos vãos do meu cérebro?
Se só uso os de ontem, não educo: condiciono. Se só uso os de hoje, não educo, complico. Se uso os de amanhã, não educo: faço experiências à custa das crianças. Se uso os três, sofro. Mas educo. Imperfeito, mas correto. Por isso educar é perder sem perder-se. Sempre.
É ameaçar o estabelecido. Mas é também integrar: Viver as perplexidades das mutações; conviver honradamente com as angústias e incertezas; ir dormir cravado de dúvidas, mas ter sensibilidade para distinguir o que muda do que é apenas efêmero; o que é permanente do que é reacionário.
É dormir assim e acordar renovado pelo trabalho interior; e poder devolver segurança, fé, confiança, formas éticas de comportamento, o verdadeiro sentido de independência e liberdade, e os deveres sociais consigo mesmo, com o próximo.
Aprender a fazer a parte que lhe cabe num esforço comum.


Artur da Távola

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