Estamos a um dia da eleição.
Vocês podem imaginar a pressão, especialmente da petralhada.
- Como é mesmo? “Se entrega, Corisco!”
E eu: “- Só me entrego na morte, de parabelo na mão!”
Se acredito nas pesquisas? Não! Entre os problemas de metodologia de todos e a má fé de alguns, prefiro resistir. Gostaria que José Serra vencesse a eleição. Vou votar nele, como todo mundo sabe. Vencer a disputa, no entanto, nunca foi uma tarefa fácil. Dilma Rousseff tinha 3% dos votos, e eu a chamava de favorita aqui. Nem tanto pelo “poder que Lula tem de transferir voto” — menor do que parece, basta que se examinem os números —, mas porque uma doxa vinha se firmando: “Governo popular não perde eleição jamais!”.
Isso pauta a cobertura da eleição de 2010 há pelo menos dois anos, quando o processo mal havia sido deflagrado. Essa máxima contaminou, digamos assim, toda a inteligência do processo eleitoral. E teve efeitos bastante negativos até na propaganda eleitoral do PSDB, coisa de que tratarei em outros textos.
Curiosamente, embora todos os institutos apontem uma vantagem relativamente folgada para Dilma Rousseff, parece que nem os petistas acreditam muito nisso. Não sei se as urnas reservam uma daquelas surpresas que desmoralizariam as pesquisas de modo acachapante — e noto que isso pode acontecer ainda que Dilma vença. O que sei, isto sim, é que o clima não é de confiança, de euforia. Não se repetem as certezas do segundo turno disputado por Lula em 2002 e 2006, contra dois bons candidatos: o próprio Serra e Geraldo Alckmin. E por que não?
Curiosamente, embora todos os institutos apontem uma vantagem relativamente folgada para Dilma Rousseff, parece que nem os petistas acreditam muito nisso. Não sei se as urnas reservam uma daquelas surpresas que desmoralizariam as pesquisas de modo acachapante — e noto que isso pode acontecer ainda que Dilma vença. O que sei, isto sim, é que o clima não é de confiança, de euforia. Não se repetem as certezas do segundo turno disputado por Lula em 2002 e 2006, contra dois bons candidatos: o próprio Serra e Geraldo Alckmin. E por que não?
Por que a desconfiança?
Porque muitos dos defeitos que os não-petistas vemos em Dilma são vistos também pelos petistas — incluindo aí boa parte da sua base eleitoral. O debate de ontem da Globo (ler post abaixo) o evidenciou mais do que qualquer outro. Sem poder fazer aquele jogo acelerado das acusações aos borbotões, sem muito espaço para satanizar o governo FHC e endeusar Lula, obrigada a dar algumas respostas minimamente objetivas, evidenciou-se o seu real tamanho. Foi uma candidata inventada por Lula e adotada pelo PT — e isso lhe garantia de saída um terço dos votos no Brasil. Mas não é do ramo. Fica tão à vontade no papel de política como, digamos, à vontade estava naquele seu terninho cinza com gorgorão na gola (é “gorgorão” aquilo? Não vou acordar Dona Reinalda para perguntar; ela não me perdoaria…).
Exerce com tal artificialismo seu papel que uma estranha avaliação passou a ser feita por alguns “analistas” depois de suas performances em debates: “Ah, não foi um desastre; então ela ganhou”. Notem o escândalo intelectual de tal formulação: aquela que pode ser a presidente da República é saudada como vitoriosa por não ser desastrada. Já sobre Serra se operava com um raciocínio mais ou menos contrário, mas não menos bucéfalo: “Ah, ele é muito melhor; então é preciso esmagá-la. Se não esmaga, então perde”. A isso chegou certa “inteligência” analítica brasileira: o que se sai melhor perde porque não massacra; a que se sai pior ganha porque não é massacrada.
A falta de raciocínio lógico é um dos desastres do nosso tempo. Eu atribuo isso a dois fatores: crise no ensino de matemática e falta de leitura. A pouca intimidade com os textos e a incapacidade de estabelecer relações entre fatores, distinguindo correlação de relação de causa e efeito, por exemplo, transformam qualquer cérebro num mingau. E tolices pavorosas vão se multiplicando. Uma das mais freqüentes ao longo da disputa eleitoral foi esta: “Se Dilma sair inteira, vence; se Serra não sair puxando os despojos, perde”. E poucos se dão conta de que o excesso de agressividade nem sempre é bem-recebido pelo telespectador. LIQUIDAR OS ARGUMENTOS DO OPONENTE NÃO É SINÔNIMO DE VENCER O DEBATE. Ontem, por exemplo, Serra vence e — e sem sangue. Mas volto ao leito.
Agora é diferente
As certezas das duas eleições anteriores vinham da aposta na figura de Lula, um debatedor competente, pouco importava as sandices que dissesse. Ontem, revi muitos trechos do debate de 2002, contra o próprio Serra. E duas coisas surpreendem: uma é a abismal quantidade de bobagens que disse o petista; a outra é a convicção com que as pronunciou. Dilma talvez seja até um pouco mais técnica do que seu mestre (desde que a gente se esforce um tantinho para entender o que ela fala), mas lhe falta o espírito que anima as palavras, o dito jogo de cintura. Num probleminha lá com o cronômetro, resolvido com grande habilidade por William Bonner, a gente viu um prenúncio de fúria. Quando o jornalista percebeu que a explicação técnica não contentaria a candidata, assumiu a culpa, comportou-se como um anfitrião humilde e decoroso e desculpou-se. Ela recobrou a frieza estudada e tentou um gracejo amistoso. Mas os petistas gelaram na cadeira.
Por que relato esse pequeno incidente? Porque ele é indicador de que ela parece sempre estar à beira de um descontrole: de um ataque dos nervos, de um ataque de fúria e, às vezes, de uma espécie de apagão. A fala é interrompida no meio, mais ou menos como se tivéssemos de aguardar o download de um arquivo muito pesado para a máquina.
Memória do primeiro turno
As desconfianças que Dilma desperta e a memória do papelão exercido pelos institutos de pesquisa no primeiro turno — só o Datafolha quase acertou o resultado; os outros ficaram vergonhosamente longe — impõem esse comportamento cauteloso aos petistas. Os petralhas bem que vêm aqui encher o meu saco com suas antevisões gozosas, achando que vou atear fogo às vestes se Dilma ganhar. Mas sabem que o fazem mais por nervosismo do que por confiança.
A propósito e já encerrando: caso Dilma vença a disputa, trabalharei normalmente na segunda-feira. Caso o vitorioso seja Serra, trabalharei normalmente na segunda-feira. O meu blog não existe porque este e aquele disputam eleição. Ou meu blog não existe porque este ou aquele ganha a eleição. O meu blog existe porque existem os leitores, e são muitos milhares, que querem ler o que escrevo. Entenderam, petralhas? Aliás, petralhas, vocês são a prova disso porque não saem daqui! Talvez o seu ódio seja quase tão fiel quanto o afeto dos que gostam desta página. E podem ficar tranqüilos: não lhes darei folga, pouco importa quem seja o vencedor. Porque, seja lá quem for o futuro presidente, estou certo de que vocês continuarão a assombrar o bom senso, o bom gosto e a boa educação!
Corisco não se entrega! Só na morte, de parabelo na mão! Se e quando Dilma ganhar a eleição, escreverei: “Dilma ganhou a eleição”. Antes? Nem pensar! Isso quem faz é o Marcos Coimbra.
Por Reinaldo Azevedo
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